Decidi sair do armário: por que é importante assumir quem somos?

Mesmo quando a vida nos privilegia com a ausência de armários robustos, somos capazes de criar armaduras que nos escondem até de nós mesmos.

É isso. Decidi sair do armário. 

Infelizmente, é verdade, alguns armários têm saídas mais difíceis e dolorosas. De modo geral, assumir que suas opções fogem do padrão hétero-normativo é uma delas. Não é disso que estou falando aqui.

Desculpe se pareceu que quis me apropriar indevidamente do termo e da situação pra lá de diferente: não foi minha intenção. Mas realmente nada poderia definir melhor esse momento da minha vida. 

Porque…sim! Eu decidi, finalmente, sair do armário. De um armário empoeirado e cheio de tranqueiras que me amarravam. Um armário com saídas não tão resistentes e ainda assim desafiantes.

Um armário, talvez, até sem portas. Com barreiras que eu mesma criei. Mas um armário onde eu (ou você) vinha me escondendo fazia muito tempo.

                                              “um belo dia resolvi mudar, e fazer tudo que eu queria fazer”
                                        

Ok. Não foi bem assim, tudo, tudo. Mas foi quase isso que senti. Então, pra não iludir ninguém, vou contar melhor:  

  • Como meu “despertar” aconteceu;
  • Qual foi essa “revelação”;
  • O que eu e todo mundo que passa por isso ganha.


Onde tudo sempre começa

Lá estava eu, no meu tempo de reflexão mais explosivo: o banho.

Enquanto eu relaxava (mais ou menos) e inocentemente traçava coisas aleatórias no vidro embaçado, uma avalanche de respostas para as minhas dúvidas, medos e inseguranças surgiu. 

Assim, assim mesmo, que um dos estalos mais importantes da minha vida aconteceu. Desse jeitinho, no meio do vapor, do chão, das paredes — não sei de onde.

Embora essa não tenha sido a primeira vez (inclusive, logo vou fazer um post especial sobre meus insights mais malucos e como a vida é louca) não posso deixar de me surpreender nos raros e privilegiados momentos em que acontece. É sempre insano. 

Sei que algumas pessoas não entendem ou mesmo duvidam. Tudo bem. Mas eu torço para que todos, um dia, possam passar por experiências assim —  onde parece que nos plugamos no universo e as coisas se conectam.

Mas nem eu acredito que isso isso tenha vindo do nada. O processo foi longo, instável e difícil (você pode entender mais sobre isso aqui) mas posso dizer que tudo, me trouxe até aquele momento . O momento do estalo. Da grande revelação.

Durante todo o mês algumas velhas dúvidas tinham voltado— ou melhor, eu voltei a elas, afinal, bom filho a casa torna. E nas últimas semanas eu vinha me perguntando, mais uma vez:


Se não é isso, o que é? O que preciso ser? O que preciso fazer? Qual minha coisa no mundo? Por que? Por que estou aqui? Quem sou eu, afinal de contas?

 


Quem tem o prazer de conviver comigo (olha ela) sabe que eu encho o saco com essas perguntas existencialistas chatas, cansativas  e apaixonantes. Encho o meu saco e o de todo mundo ao meu redor. E talvez seja por isso que raramente tem muita gente ao meu redor.  Encho mesmo. 

Mas acredito realmente que se perguntar constantemente nos sensibiliza ou, por que não dizer, nos força a ver outras coisas que não vemos no piloto automático. Portanto, caso você esteja em dúvida sobre quem você é ou se está fazendo certo alguma coisa, meu primeiro conselho não solicitado é: QUESTIONE, alimente esta dúvida dentro de você. 

Não se deixe levar pelas distrações fáceis. Não ofusque o medo, a dúvida, a insegurança. Nem de você nem dos outros em quem confia. Converse sobre isso sempre que possível, leia sobre isso sempre que possível. 

Até que as respostas venham. Porque mesmo que depois elas mudem, uma coisa é verdade:

 

Elas sempre vêm

Então, como já aconteceu diversas outras vezes, entrei no banho (porque sou pobre, mas sou limpinha).  Mas quem saiu de lá, não foi a mesma Luana. Entrei uma pessoa, saí outra.

Entrei uma Luana. Cheia de dúvidas, medos, incertezas, inseguranças e todos os ingredientes bem especiais que cada um chama de um jeito. 

Verdade, entrei aquela Luana. E saí com o mesmo rosto, as mesmas espinhas, a mesma altura. Mas quem saiu de lá não era mais “a eu” de antes. É isso, de que outro jeito posso explicar? Simplesmente entrei no banho uma pessoa e saí outra.

Não sei se foi um upgrade. Mas posso garantir que foi um lançamento cheio de empolgação e de expectativas que só dependiam de mim.

Porque, como eu saí?! Certa, certinha, de como tava entendendo e fazendo tudo errado. E ao mesmo tempo radiante por que agora eu sabia como acertar. Fiquei repetindo, em silêncio e em barulho, para mim mesma, para quem pudesse ouvir:

Como pude ser tão cega? Como demorei tanto tempo? Estava ali o tempo todo.


Eu sou de humanas. Ponto. Sou de humanas, gente. Sempre fui. Pronto. Falei. Revelação.

 

                                        desculpa, não posso evitar

Sem querer ser piegas e manifestar claramente que sou do tempo do Orkut ou estereotipar – afinal sou suficientemente adulta para saber que aqueles gráficos que dividem as pessoas em dois grupos são ótimos parar rir mas não servem na vida real – essa realmente foi uma frase que fez sentido.

Deixe-me explicar. Durante uma grande parte da minha história eu fui calada e reservada. Eu morria de medo de me expor e de me arriscar. Portanto, passadas as primeiras rejeições e a descoberta de que o mundo podia ser bem cruel, aprendi uma forma nova de viver.

E nesse modelo eu calculava tudo. Eu imaginava cada ponto, cada estratégia, cada risco. Por isso, naturalmente, muitas pessoas, ao longo da vida, me viam como analítica, ponderada, razoável. Até passei a ser muito boa em matemática. Ou seja, um típico quadro das exatas.

Outro ponto favorável é que, mesmo nas minhas fases mais sociáveis, estar sozinha era um verdadeiro oásis para mim, e nunca gostei muito de falatório e “gentarada” – mais um ponto para exatas. Mas não.


Eu sou de humanas

É claro que estas deturpações de percepção só mostram como estereótipos do tipo não ajudam em nada no processo de autoconhecimento.

E não há dúvida de que minha pertença ao grupo de “exatas” se desfazia assim que as pessoas me conheciam melhor ou descobriam segredos tenebrosos sobre mim, como minha adoração por literatura e ficção, ou o fato de que eu escrevia poesia.

Mas, vamos lá! Você entendeu o uso da polarização, certo?! O fato é que entrei sendo só Luana, a “o que”. Saí sendo Luana, a artista.

Sei que pode parecer até bobagem. Que isso não deve ter acontecido exatamente como contei a vocês. Mas foi. Foi como se, no banho, eu tivesse cruzado com um Mestre dos Magos do bem (tenho certeza). 

E ele, ao invés de sugestões vagas, ao invés de um mapa confuso, de uma fórmula inteligível ou uma charada misteriosa impossível, tivesse me dado — meio apagadinho pela poeira do tempo, do esquecimento e da negligência, mas ainda lindo — o tesouro prontinho

E foi como se eu o tivesse recebido tal qual uma mãe recebe um filho perdido que finalmente foi reencontrado: maltrapilho, esfomeado, implorando por afeto e trato. 

Eu o aceitei com carinho e vi todo o brilho opaco. Precisava tirar o pó para a luz sair e depois seguir a função que nunca deveria ter parado: alimentá-lo, lapidá-lo, ajudá-lo a ser no mundo.

É verdade, ele foi para lá porque tive vergonha. Esse tempo todo, sempre foi vergonha. Nunca foi incompetência. Nunca foi falta — a não ser de vergonha na cara. Porque quase sempre eu me deixava levar por um caminho mais atraente. Mais fácil, mais certo. 

Demorei. Demorei demais. Mas já entendo que cada dor e cada alegria foram necessários. Pontuaram meu caminho até aqui, deram o ritmo necessário na hora certa.

Nada foi em vão. Aprendi umas coisas aí. Uma delas foi que descobri e aceitei que eu não posso controlar o meu destino. Mas posso coordenar minhas ações. Posso parar de ter vergonha. Posso me expor. Expor quem eu sou de verdade. 

E isso que nunca menti a respeito. No entanto, ter que me esconder para fazer as coisas de que eu gostava – coisas que eu sabia que não deixaria de fazer e nunca fiz para ganhar nada exceto a satisfação por si só – já não parecia mais fazer sentido. 

Como escrever. Aliás, foi a primeira. Aprendi a ler e escrever razoavelmente cedo. E lembro que desde então eu gostava ainda mais da segunda função.

Escrever sempre foi minha forma de expressão preferida (diferente dos meus pais e pessoas que receberam algumas cartas nada elogiosas). A escrita sempre foi a forma com que me imprimia no mundo e deixava ele imprimir em mim.

Eu não saberia dizer se sempre escrevi porque sempre pensei demais, ou o inverso. Mas a verdade é que essa paixão foi descobrindo novas maneiras de se declarar.

Assim, me deparei com uma porção de coisas que complementavam a minha necessidade de me expressar: o lettering, as cores, colagens, fotografias.

Não posso escolher um só. Desculpa, escrita. Desculpa a todo mundo que tentou me dizer que não posso ficar com tudo: eu descobri que, na verdade, não posso NÃO ficar. Tudo sou eu.

Então, agora, estou oficializando o romance e assumindo esse filho. Mas é mais que isso. Estou oficializando e assumindo esse relacionamento bem poligâmico com minha natureza artística.

Não foi o blog que nasceu assim. Eu renasci através disso. Essas coisas foram nascendo em mim, e agora estou parindo. Minha vida não terá mais filho fora do casamento. Assumi tudo.

Estou subindo no palco da minha vida, assumindo todos os riscos, todas as vaias e cada pequeno aplauso — porque sei que vou falhar muitas vezes. Tomara: estou pronta para aprender com cada falha.


Então…por que mesmo que é importante assumir quem somos?

Bom, essa era a pergunta inicial mas, se não ficou totalmente claro e se meu falatório confundiu um pouco, vou resumir em cinco tópicos, te dizendo as coisas que a gente ganha quando decide ser a gente mesmo e se abraça com tudo que isso significa. 

  1. Liberdade para fazer coisas malucas que antes não se permitia;
  2. Leveza e capacidade de lidar consigo mesmo com gentileza e compaixão;
  3. Autonomia para realizar e decidir as próprias coisas;
  4. Compreensão de coisas que você achava que tinha dado errado; 
  5. Alívio por se livrar da sensação constante de que você tomou a decisão errada. 

Se você acha pouco, acha que não precisa disso, segue aí sua vida. Mas se você acha que dá pra fazer melhor com o presente que é a vida, é fácil começar. 

 

 

PRÁTICA

Para não deixarmos que minhas maluquices morram na praia, vou buscar sempre deixar uma prática: uma sugestão de algum exercício que me trouxe um bom resultado, fruto do instinto, das leituras ou das conversas com outras pessoas.

             clique aqui para ouvir a música recomendada para essa prática

1. Pegue uma folha e escreva nela todos os armários e tranqueiras da sua vida. Todas as coisas que te prendem e das quais você gostaria de se libertar. Todas as suas dores, dúvidas, medos (se quiser, você pode registrar com uma foto e salvar em algum lugar);
2. Depois separe os itens anotados, recortando e pensando individualmente em cada um deles, dobrando e colocando em qualquer lugar assim que concluir de pensar o que precisar sobre ele;
3. Espere algum tempo (recomendo no máximo um mês) e mantenha-se sensível, nesse período, a identificar gatilhos e manifestações destas coisas que você anotou;
4. Após o período, acesse novamente os papeis e reveja, e lembrando-se dos gatilhos e manifestações observados;
5. Tire suas conclusões e estipule uma meta/ação a partir delas. Algo simples que você possa fazer e acompanhar. (quanto aos papeis, você pode queimá-los, rasgá-los, cuspir neles, o que bem entender).
Se quiser, publique sua experiência no instagram e twitter usando #assimpassa ou nos envie um e-mail!

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